Heitor Ferraz transpõe para a poesia a solidão e a angústia do homem moderno, que não consegue reter as experiências, que apenas o atravessam. Segura e concisa, sua poesia captura instantâneos do cotidiano: a cidade que se rebobina pelo vidro retrovisor, a manhã que chega com solavancos de pneus, a paisagem que seca na janela, no varal.
Um a menos divide-se em três partes. Na primeira, gestos e imagens simples despertam a consciência e o assombro do poeta com o mundo. Na segunda, o vício do cigarro conduz os poemas, em ondas de mesmo tom e ritmo. Um cigarro que, fumado à janela, abre um horizonte de reflexões sobre a vida, o trabalho e o amor. A última parte apresenta uma peça poética, com elementos dramáticos de uma voz presa a um “capacho”, que não se reconhece em lugar algum, que se despedaça. Utilizando as palavras como âncoras, essa voz tenta se fixar na realidade, consciente de que é entre as possibilidades e limitações dessa tarefa que se constrói a poesia.
Leia um poema de Um a menos
Primeiro foi isso:
ouvir o nome
deixar o nome
tomar corpo
enquanto o repetia
várias vezes o repetia
dentro e fora da boca
como quem experimenta
e olha
uma fruta
de sabor exótico
e conhecido
Depois,
foi a própria forma
que foi tomando forma
o vestido verde
silencioso
a tatuagem
um ponto secreto
num mapa de veias
de ruas novas
ondas
onde tudo se bifurca:
lugar fresco
onde se aconchegar
com a palavra
ainda úmida.
Belo comercial, que bom, bom pra poesia
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